Infeção
de Prótese
Embora na teoria seja fácil de definir infeção (muitas vezes chamada de rejeição) de prótese como falência causada pela presença de bactérias no interface prótese-osso. Embora alguns casos sejam evidentes, na prática clínica pode por vezes ser extremamente difícil estar certo da sua presença ou ausência.
Essa dificuldade é refletida pela existência de diferentes definições na literatura internacional contando as duas mais recentes do International Consensus Meeting (ICM) de Philadelphia 2018 e da European Bone and Joint Infection Society (EBJIS) 2020 com a co-autoria do próprio Prof. Doutor Ricardo Sousa. (fig1 e fig2)
Na maior parte dos casos a infeção ocorre por contaminação bacteriana durante a cirurgia original. Por isso mesmo, a maioria das infeções é diagnosticada nos primeiros anos após a colocação da prótese.
Apesar de todos os esforços para a prevenção, a verdade é que existe em qualquer lugar do mundo, uma percentagem pequena mas sempre presente de infeções que ronda o 1-2%.
Naturalmente existem factores de risco que podem fazer aumentar esse risco como a presença de obesidade, diabetes, insuficiência renal, imunossupressão, etc.
Geralmente a infeção de uma prótese não se caracteriza por um quadro de infeção florido com os habituais sinais inflamatórios locais – como pus e febre -, mas antes por um quadro de dor crónica, com ou sem outros sintomas como inchaço e/ou rigidez associados
Isto acontece porque as bactérias formam uma espécie de película na superfície da prótese, o chamado biofilme, onde sobrevivem protegendo-se da ação do sistema imunitário do organismo e dos antibióticos. Aí perpetuam uma resposta inflamatória persistente mas localizada que elude os tradicionais critérios de avaliação clínica e laboratorial de infeção.
A avaliação clínica e radiográfica simples não é suficiente para excluir o diagnóstico de infeção de prótese. Exceto nos casos em que a presença de uma fístula cutânea com drenagem é suficiente para afirmar o diagnóstico, o exame físico é extremamente inespecífico e variável, podendo até ser completamente normal.
Assim, a avaliação inicial deve ser clínica e laboratorial, pesquisando:
1) a presença de fatores de risco para infeção, como comorbilidades prévias do doente (ex. diabetes, obesidade, imunossupressão, etc.) ou historial cirúrgico (cirurgias prévias/cirurgia de revisão, dificuldades de cicatrização/drenagem prolongada no pós-operatório, etc.).
2) a cronologia da dor, uma vez que se sabe que quanto mais precoce for a falência após a cirurgia original mais provável é a presença de infeção.
3) a presença de marcadores inflamatórios, como velocidade de sedimentação (VS) e proteína C reativa (PCR).
Se todos os parâmetros anteriormente descritos forem negativos, a probabilidade de infeção é extremamente reduzida e outros motivos para a dor devem ser exaustivamente procurados.
Se a suspeita se mantiver, a melhor alternativa diagnóstica pré-operatória é a recolha de liquido sinovial (i.e. da própria articulação) para estudo. No caso específico do joelho, essa colheita pode ser feita de forma simples em ambulatório, mas no caso de outras articulações (ex. anca ou ombro) pode ser necessário realizar esse procedimento com apoio de ecografia ou mesmo no bloco com apoio de radioscopia.
(fig 4)
O líquido obtido deve ser enviado não só para pesquisa direta de bactérias, ou seja, estudo microbiológico, mas também para análises que meçam a resposta do organismo à eventual presença de bactérias. Isto porque, devido à infeção por formação de biofilme, muitas vezes não existem bactérias livres no liquido sinovial e o estudo microbiológico é negativo mesmo perante uma infeção.
Para medir a resposta do organismo, o teste mais frequentemente utilizado é a contagem diferencial de leucócitos (que são as células responsáveis por combater infeções no organismo humano), embora também possam ser utilizados uma série de outros marcadores como a esterase leucocitária, calprotectina ou alfa-defensina.
No caso de não ser possível colher líquido para analisar (no joelho esta situação é pouco frequente mas acontece mais comumente noutras articulações como por exemplo na anca) pode ser necessário realizar outros exames como biópsias percutâneas que devem, obrigatoriamente, ser realizadas em ambiente absolutamente estéril, ou seja no bloco operatório e com apoio de radioscopia. (fig 5)
Apesar da realização otimizada do estudo pré-operatório, não é infrequente que só se chegue ao diagnóstico definitivo (i.e. está ou não está infetado? Qual a(s) bactéria(s) responsável pela infeção? Qual a sensibilidade a antibióticos dessa(s) bactéria(s)?) após a cirurgia de revisão de prótese.
Para além do estudo microbiológico, também o estudo histológico pode ajudar a determinar a presença ou não de infeção, embora não ofereça informação sobre qual a bactéria presente ou quais os antibióticos mais indicados.
Na esmagadora maioria das situações, o tratamento de uma infeção de prótese implica algum tipo de tratamento cirúrgico associado a antibióticos dirigidos à(s) bactéria(s) identificada(s).
Essa cirurgia pode passar apenas por uma limpeza cirúrgica se a infeção acontecer numa fase aguda, ou por uma cirurgia de revisão se a infeção for diagnosticada numa fase crónica.
Nestes casos a abordagem mais tradicional é a revisão em dois tempos: numa primeira cirurgia retira-se a protese infetada e coloca-se um espaçador que não só mantém alguma função como transporta altas doses de antibiótico para ajudar a curar a infeção. Algum tempo depois, quando a infeção está curada volta a operar-se para colocar uma nova prótese.
Com a experiência e aumentar do conhecimento nesta área, nos últimos anos tem sido possível reduzir significativamente o intervalo de tempo entre as duas cirurgias e em alguns casos selecionados pode mesmo ser possivel realizar o tratamento numa única cirurgia, ou seja, revisão em um tempo.
Copyright © 2024 Ricardo Sousa Ortopedia Todos os Direitos Reservados
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